Quantas moças precisam sorrir
                      Dentro de um elevador
Pra aquecer o mês de julho inteiro?



Garçom!
Uma mesa pra cem,
Por favor!

Uma cerveja e cem copos
Qualquer uma
Bem gelada
Sem espuma

Garçom!
Uma mesa pra ser,
Por favor!

Pra sentar e ser
Não escutar
Não falar
Nem beber

E o cinzeiro também



Engulo palavras que não passam pela garganta.
Mastigo e digiro cada letra, saboreio significados. Doces. Salgados.
Mas quando preciso de palavras, só me aparecem estas pastosas frases para crianças e doentes.
Inócuas aos dentes.
Prefiro então não digerir.
Da sopa de sobras, não ofereço uma colher.
De gosto de esgoto.
Desgosto.
Ofereço - quando posso - um vômito conciso e lacônico, esmerada refeição para moscas.



Ela na calçada
Ele na janela

Ela olhou pra baixo
Ele olhou pra cima

Rolou um clima



MIS
MASP
Bienal

Pinacoteca
Florença
Centro Cultural

Já fui em tudo

Não entendi um caralho





bailarina

a agulha e o caminho

dançam devagarinho


quase



não tocam

os dedos leves da moça

a respiração do silêncio

o vento



cantam

trocam mudam de lado

ouvem o choro chiado

passado




O rosto rubro frente à indecência
A obediência

Como finge bem
A ‘pessoa de bem’

Um modelo exemplar
De ser (menos) humano
Da forma correta
Um ledo engano

O pior tipo
                  O que mais me dá medo
É o sujeito
                  Que acredita em si mesmo




Fim de tarde amarelo.

A poluição é um prisma fosco para o sol.

As nuvens flutuam pesando toneladas.

Sinto que vou esquecer tudo que sei. Meu nome, endereço, senhas. Anoto freneticamente todos meus planos absurdos, agendas para os próximos segundos, ridículas observações sobre nada. Planejo minhas próximas palavras, para que ao abrir a boca não corra o risco de sair alguma verdade.

Vendo de dentro, tudo parece ridículo e gigan(gro)tesco. Engulo seco e preparo o teatro da minha vida. Tramo minhas mentiras detrás da cortina. Mas quando saio, não há plateia, somente eu. Então enceno para mim mesmo, e depois rio e aplaudo (sentado) à beça, tão absurda é a peça.

Penso em algum bom motivo – você – para não enlouquecer.

Às vezes funciona.

Hoje não.